Neste Dia da Terra palestina, ampliar mobilização contra feira do apartheid na Unicamp

Neste Dia da Terra palestina, ampliar mobilização contra feira do apartheid na Unicamp

Soraya Misleh

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Trinta de março (Dia da Terra) é uma data para lembrar, resistir e fortalecer a solidariedade internacional com o povo palestino. Nesse sentido, desde o Brasil, conclamamos estudantes, trabalhadores e trabalhadores, oprimidos e explorados a ampliarem a mobilização contra a realização da Feira das Universidades Israelenses na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) no próximo 3 de abril.

A inspiração é a própria razão do Dia da Terra. Na data, em 1976, greve e protestos massivos ocorreram na Palestina ocupada em 1948 (que hoje se denomina Israel) contra a tomada de terras na Galileia. A repressão violenta deixou centenas de feridos, além de mortos. Mas não apagou da memória mais esse marco da resistência heroica e histórica, que segue viva: persiste, não esquece e não se dobra.

Não à normalização

Na contramão da solidariedade internacional, contudo, a Unicamp reafirma que suas portas estão abertas ao apartheid israelense. Isso enquanto o projeto colonial sionista aprofunda a limpeza étnica, tendo assassinado apenas nos três primeiros meses do ano mais de 90 palestinos, entre os quais crianças, somente na Cisjordânia ocupada. Normalização e cumplicidade vergonhosas com o apartheid decorrente da contínua Nakba (catástrofe palestina cuja pedra basilar é a formação do Estado racista de Israel em 1948), que maculam a imagem da quinta melhor universidade da América Latina e segunda do Brasil.

Apesar dos inúmeros apelos e cartas de repúdio da comunidade palestina e organizações solidárias, bem como dos protestos de estudantes, docentes e trabalhadores em geral, o reitor Antonio José de Almeida Meirelles (Tom Zé) decidiu arbitrariamente manter a realização da Feira das Universidades Israelenses na universidade na próxima segunda-feira (3/4). Seu argumento pelo diálogo ignora que não são dois lados iguais, mas um colonizador (Israel) e um povo colonizado (palestinos) – como amplamente explicitado nas diversas manifestações que chegaram às suas mãos e ouvidos. Esquece as lições da solidariedade internacional em relação ao regime de apartheid na África do Sul nos anos 1990. Passa por cima, assim, do que demonstram até mesmo relatórios de organizações reconhecidas internacionalmente: Israel impõe um regime de segregação institucionalizado contra os palestinos.

A Frente em Defesa do Povo Palestino, que reúne dezenas de organizações em solidariedade, em carta ao reitor “Tom Zé”, detalha: “Não é de hoje que estudantes, professores e funcionários têm informado e trazido para a Unicamp o debate sobre a colonização israelense, limpeza étnica nas terras palestinas e, portanto, violação pelo Estado de Israel de todos os direitos humanos fundamentais. Esse processo histórico já dura 75 anos, como comprovado inclusive por historiadores israelenses como Ilan Pappé. A consequência é a instituição de um regime de apartheid, como reconhecido, entre outras, pela Anistia Internacional, Human Rights Watch e a organização israelense de direitos humanos B´Tselem. Os relatórios dessas organizações concluem, com base no Direito Internacional, que Israel promove apartheid contra os palestinos, um crime contra a humanidade. Revelam todo um aparato implementado para a segregação. As universidades israelenses, como demonstram estudos internacionais, são parte desse aparato.” 

A carta segue: “Em seu chamado por boicote acadêmico, a sociedade palestina revela que ‘durante décadas, as universidades israelenses desempenharam um papel fundamental no planejamento, implementação e justificação das políticas de ocupação e apartheid de Israel, mantendo uma relação estreita e única com os militares israelenses’. Além disso, como enfatiza a campanha, ‘um estudo da Human Rights Watch revela discriminação racial institucionalizada contra palestinos em todo o sistema educacional de Israel, incluindo universidades’.”

Essas instituições são parte orgânica de um sistema de segregação que tem como marcas a limpeza étnica e colonização agressiva. Seus campi, construídos sobre aldeias palestinas destruídas a partir de 1948, são os locais onde se realizam pesquisas e desenvolvimentos militares, assim como se alimenta a ideologia que sustenta o regime de apartheid israelense. 

Ainda como informado ao reitor na carta, a Universidade de Tel Aviv, prevista para participar da feira, como aponta a campanha de boicote acadêmico, “desenvolveu dezenas de sistemas de armas e a ‘doutrina Dahiya’ de força desproporcional empregada pelos militares israelenses para cometer crimes de guerra contra civis palestinos e libaneses”. Tal doutrina foi implementada pelas forças de ocupação israelenses em massacres na estreita faixa de Gaza, que enfrenta cerco desumano há 16 anos e bombardeios frequentes.

Outra participante da feira, continua a Frente Palestina em sua carta a “Tom Zé”, “a Technion desenvolve tecnologias de drones militares e escavadeiras controladas remotamente usadas para demolir casas palestinas. A Anistia Internacional demonstra que ano a ano são centenas de lares palestinos postos abaixo pelo apartheid israelense, em velocidade alarmante, para a implementação de mais assentamentos ilegais”.

Segundo o Palestine Data Center, somente no mês passado, foram demolidas 40 casas palestinas na Cisjordânia ocupada. Bairros e vilas palestinas, sobretudo em Jerusalém, estão ameaçados de esvaziamento na contínua limpeza étnica. A aldeia de Al Araqib, no Negev, já foi destruída 211 vezes, e os beduínos palestinos seguem a reerguê-la a cada agressão. Palestinos são obrigados a demolir suas próprias casas e ainda pagar por isso. A punição coletiva é parte intrínseca da limpeza étnica planejada.

A Universidade Hebraica – também participante da feira na Unicamp –, conta, entre outros, como também informado ao reitor, “com o programa militar Talpiot, patrocinado pelas forças de ocupação israelenses. Os estudantes aperfeiçoam seu aprendizado em ‘campo’, utilizando seus conhecimentos para aprofundar a pesquisa e o desenvolvimento militar.”

A carta conclui: “Entendemos que iniciativas que contribuem para a manutenção de um regime de apartheid não deveriam ter lugar dentro de uma universidade. A instituição pública, por sua importância, deveria estar na linha de frente como um espaço livre de apartheid. [...] E o primeiro passo é cancelar a Feira das Universidades Israelenses na Unicamp, assim como qualquer convênio com o Consulado Geral de Israel em São Paulo, representante oficial do regime de apartheid. Da mesma forma, suspender qualquer tipo de cooperação com instituições israelenses, todas implicadas na colonização e apartheid a que estão submetidos dia a dia os palestinos. Liberdade acadêmica não deve ser confundida com apoio a violação de direitos humanos fundamentais.”

Diante do lavar às mãos do reitor ao sofrimento do povo palestino, neste Dia da Terra fica o chamado para que se construa ampla mobilização e resistência contra a decisão pela cumplicidade e normalização da Unicamp com o apartheid israelense. Não à Feira das Universidades Israelenses no próximo 3 de abril. Liberdade acadêmica não combina com apartheid.

Soraya Misleh - Integrante da Frente Nacional Em Defesa da Palestina e militante da CSP-Conlutas

Artigo publicado originalmente no Monitor do Oriente

Neste Dia da Terra palestina, ampliar mobilização contra feira do apartheid na Unicamp

 

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