Contrariando a Fifa e governo do Catar, Copa é palco de manifestações
A Fifa (Federação Internacional de Futebol) e o governo do Catar bem que tentam, mas as manifestações políticas já são as marcas da Copa do Mundo de 2022. Prestes a encerrar a fase de grupos, o torneio mundial tem sido palco de diferentes manifestações que o tornam um dos mais politizados das últimas décadas.
Os torcedores que acompanhavam a partida entre Uruguai e Portugal, na segunda-feira (28), foram lembrados do momento agitado que vive o mundo fora das quatro linhas, quando o italiano Mário Ferri invadiu o gramado interrompendo a partida por alguns segundos.
Segurando em uma das mãos a bandeira com as cores do arco-íris, símbolo do movimento gay, o ativista vestia uma camiseta onde se podia ler “Save Ukraine” (Salvem a Ucrânia). Já em suas costas estava escrito “Respect for iranian woman” (Respeito pelas mulheres iranianas).
A ação de Ferri, que também esteve no Brasil na Copa de 2014, alerta sobre a perseguição à comunidade LGBT pelo governo catari, denuncia o machismo nas leis do Irã e o assassinato de Mahsa Amini e traz a tona a invasão russa na Ucrânia, motivo pelo qual o país agressor foi banido de competições esportivas.
Ferri não está sozinho. As pautas levantadas por ele estão em diversos vídeos que circulam na internet. Dentro e fora dos estádios, torcedores têm driblado as autoridades, como os marroquinos que nas ruas de Doha cantam hinos de solidariedade ao povo palestino e nas arquibancadas levam consigo inúmeras bandeiras do país invadido por Israel.
Seleções protestam
Outra marca deste Mundial é o envolvimento das seleções nos protestos. Antes do campeonato começar, capitães de sete equipes (Inglaterra, País de Gales, Bélgica, Holanda, Suíça, Alemanha e Dinamarca) planejavam usar a braçadeira “One Love”, com as cores do movimento LGBT.
De forma autoritária a Fifa proibiu o ato e ameaçou punir esportivamente os times que, ao fim, cederam. No entanto, jogadores da Alemanha posaram com as mãos tapando a boca, sinalizando a censura cometida pela entidade máxima do futebol.
Já o time dinamarquês trouxe sua manifestação nos uniformes. Além de criar um modelo com camisa, shorts e meias pretas, em memória aos cerca de seis mil trabalhadores que morreram para que o evento ocorresse, nos demais modelos de vestimentas, o distintivo da seleção foi “apagado”.
O selecionado do Irã também se manifestou contra a opressão praticada pelo governo do país, deixando de cantar o hino nacional. Por sua vez, a Holanda vai leiloar todas as camisas utilizadas no torneio e o dinheiro arrecadado será destinado a trabalhadores estrangeiros no Catar
Já a seleção inglesa se ajoelhou antes do início de sua primeira partida. O ato ganhou notoriedade na luta contra o racismo travada pelo movimento norte-americano Black Lives Matter (Vidas Negras Importam).
Repressão
Se atos progressistas crescem, a repressão e o reacionarismo também tentam dar sua resposta. No Catar, onde a homossexualidade é crime e pode render até oito anos de prisão, a sanha de apagar as manifestações de orgulho LGBT chegou a níveis que beiram o ridículo.
Qualquer um que ostente as cores do arco-íris é reprimido. Um caso emblemático ocorreu com uma família brasileira que levava consigo uma bandeira de Pernambuco. O arco-íris na diagramação da flâmula que representa o estado nordestino foi o suficiente para que as autoridades cataris confiscassem o item.
E o Brasil?
Cooptada de forma reacionária por manifestantes bolsonaristas que têm realizado manifestações golpistas, a camisa da seleção da CBF não chega ao Catar com a promessa de defender qualquer causa social.
Talvez um alento à maioria do povo brasileiro que não compactua com o golpismo tenha sido os dois gols de Richarlison na estreia da seleção canarinho. O atacante que usa a nove é, sem dúvida, o mais ativo politicamente entre todos os selecionáveis que estão no Catar.
Ele já se posicionou fortemente nas luta contra o racismo no Brasil e em defesa do meio ambiente. Além disso, doou todo dinheiro arrecadado com o leilão de suas chuteiras a um programa da USP que ajudava no enfrentamento da pandemia.
No auge das mortes por covid-19, o centroavante dialogou com as pessoas sobre a importância dos cuidados contra o vírus e cobrou vacina das autoridades.
“Quando tiver uma causa importante eu sempre vou botar a cara, ainda mais jogando na seleção e na Inglaterra. Eu tenho essa visibilidade e sei que as autoridades olharão com carinho”, afirmou Richarlison em entrevista ao jornal O globo.
Ofensas a Gil
Como Neymar saiu machucado de campo sem cumprir a promessa de marcar um gol e homenagear Bolsonaro, coube a um grupo de torcedores bolsonaristas a única manifestação política de brasileiros até o momento.
Lamentavelmente, com a ignorância e violência características dos apoiadores do presidente derrotado nas eleições, o grupo agrediu verbalmente o artista Gilberto Gil, de 80 anos.
Ataques infundados à lei Rouanet, gritos de apoio a Bolsonaro e ofensas de baixo calão foram proferidas. Um dos participantes da confusão é o empresário Ranier Lemache. Defensor da Ditadura Militar nas redes sociais, ele responde por ter recebido auxílio emergencial de forma irregular durante a pandemia.
Vamos pra cima!
A CSP-Conlutas defende o livre direito à manifestação política e repudia os autoritarismos da Fifa e dos governantes do Catar. O esporte, como qualquer atividade humana, não está alheio à política e deve ser também instrumento de organização dos trabalhadores para a construção de uma sociedade justa e igualitária.