Carta à Comissão dos Trabalhadores da CSN-UPV, em Volta Redonda (RJ)

Carta à Comissão dos Trabalhadores da CSN-UPV, em Volta Redonda (RJ)

Por Atnágoras Lopes

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"Já foi-se o tempo em que dava orgulho trabalhar pra CSN. Hoje, é só humilhação e vergonha". "Quando entrei aqui, há mais de doze anos, eu ganhava mais de três salários. Hoje, não ganho nem um salário mínimo e meio”. "Esse sindicato safado tirou nosso plano de saúde, botou a jornada para 8 horas e faz três anos que temos zero de reajuste. Tem que tirar esses caras". "Esse Benjamin tá igual ao Putin: é humilhação e opressão". 

Essas são algumas das frases que se pode ouvir dos trabalhadores e trabalhadoras da CSN, de Volta Redonda (RJ), durante mais de dois meses, desde que começaram a luta por melhores salários, direitos e condições de trabalho.

É inacreditável mas, hoje, o operário da fábrica está ganhando apenas cerca de R$ 1.300,00 por mês. Está escravizado por um famigerado banco de horas. Não recebe horas extras. Perdeu a cobertura nacional do plano de saúde. O turno que era de 6 horas passou para 8 horas e não recebe PLR (Participação nos Lucros e Resultados). Enquanto isso, Benjamim Steinbruch, dono da Companhia, debocha de seus empregados e, com escárnio, comemora o maior lucro anual da empresa. Em 2021, foram R$ 13 bilhões e só no primeiro trimestre desse ano foram mais R$ 1,7 bilhão de lucro líquido.

Toda essa degradação das condições de salário e de direitos se impôs com a anuência da atual direção do sindicato da categoria que, por esse motivo, sofre uma repulsa legítima, justa e generalizada dos cerca de doze mil operários e operárias da usina.

Steinbruch lançou vídeos nas redes sociais comemorando sua fortuna e, em tom de deboche, falou que "o peão tem que comer um sanduíche com uma mão e operar uma máquina com a outra". Sua meta é explorar ainda mais seus empregados. 

Foi nesse catastrófico cenário que, indignados, os trabalhadores e trabalhadoras se levantaram em luta, esse ano, e continuam em mobilização em defesa de suas pautas em meio ao período de data base que, inclusive, já foi prorrogado duas vezes.

Foi uma explosão da base que, ao que tudo indica, iniciou-se pelos operários e operárias do andaime. O ocorrido se deu há sete semanas quando esses companheiros pararam suas atividades e saíram numa caminhada dentro da fábrica, arrastando centenas e, por três semanas, reunindo milhares em protesto contra as péssimas condições de trabalho e de salários. 
Até hoje, a mobilização persiste e enfrenta dezenas de demissões ilegais, a intransigência da empresa e as vergonhosas manobras da direção do sindicato da categoria que, na prática, se tornou uma agência de defesa dos interesses da empresa contra os trabalhadores. 

Contra tudo isso, gestada no chão da fábrica, uma comissão de base tomou a frente dos protestos e se afirmou como direção independente do movimento e tem contado com o apoio incondicional de nossa Central, a CSP-Conlutas, bem como de inúmeras outras entidades do movimento, inclusive, influenciando uma articulação nacional dos trabalhadores e trabalhadoras da CSN.

Estamos diante de uma mobilização histórica da classe operária brasileira nesse último período. Sim, histórica e nacionalizada pois, junto às manifestações de Volta Redonda (RJ), também ocorreram paralisações importantes nas minas de Congonhas (MG) e dos trabalhadores do Porto de Itaguaí (RJ).

Essa luta que ainda está em curso já demonstra e aponta muitos ensinamentos. Partindo de uma pauta econômica e pela força do processo se fez brotar uma enorme vanguarda de ativistas, fertiliza-se o terreno do campo das ideias, dos questionamentos, da descoberta dos agentes da exploração capitalista, do papel nefasto que cumpre uma burocracia sindical vendida, da importância do tema da reestatização dessa empresa - que já foi símbolo de orgulho e de soberania nacional -, da necessidade de construir uma nova direção com independência de classe para o movimento e tantos outros assuntos.

Sim, não é apenas desejo de que esses temas venham a ser debatido em meio a esse levante, é um fato que nas centenas de homens e mulheres que são a vanguarda desse processo esses assuntos estão em discussão e que bom que assim o seja.

A mobilização, a paralisação e a greve são, ao longo da história da luta de classes, ferramentas que têm a força política de confrontar o capital e, por isso, esse método tem a magia de permitir arrancar vitórias econômicas mas, ao mesmo tempo, despertar elementos estratégicos da consciência de classe. 

Por esse motivo causa tanto pavor e reação truculenta dos grandes proprietários e seus agentes do mundo capitalista como ocorre agora na luta operária contra a CSN. A empresa se utiliza da demissão em massa, da perseguição, do assédio e um conjunto permanente de práticas antissindicais. É o que temos visto até aqui e, também, o que tem visto, sem nenhuma intervenção efetiva, os órgãos institucionais do chamado “mundo do trabalho”.

Quanto mais há crise no sistema capitalista, como a que estamos vivenciando, mais ainda as direções burocráticas do movimento se lançam como agentes do capital. Em Volta Redonda, nesse processo, eleve-se essa constatação histórica à "enésima" potência. É escandaloso observar tanta traição, imobilismo e parceria com a patronal por parte da atual direção do sindicato. É repugnante!

No atual cenário da luta de classes de nosso país, ver os trabalhadores e trabalhadoras da CSN tomarem o método da ação direta como forma de enfrentar o nível de exploração ao qual estão submetidos é uma enorme conquista política. Assistir ao protagonismo dessa vanguarda, que orbita em torno da Comissão de Base, que influencia a massa operária e que, por mais de dois meses nos diferentes estágios dessa luta, mantém-se erguida é um sinal do "esperançar-se" quanto o papel estratégico da classe operária.

Essa luta, inclusive, trouxe à ordem do dia a palavra que apontava a necessidade de construir a "Greve Nacional dos Trabalhadores da CSN”, bem como nos permite trazer ao debate outras pautas de cunho estratégico. Entre elas a defesa da reestatização da CSN para que todos e todas que nela trabalhem, venham resgatar melhores condições de salários e mais direitos e, ao mesmo tempo, para que esse patrimônio nacional venha colocar sua produção e resultados a serviço do país e de nossa soberania. Uma empresa da importância da CSN não pode ser para que meia dúzia de acionistas sigam zombando da nossa cara, de nossa classe, e esbanjando seu lucro exorbitante às custas de nosso sangue e nosso suor. 

Apesar da truculência patronal, a categoria, com o apoio dos movimentos, pode e deve colocar o tema de sua luta nesses marcos. Está evidente que em Volta Redonda está se afirmando uma nova direção operária para movimento e, como tal, já se propõe a ser uma nova direção também para o seu sindicato. 

A vontade de varrer os pelegos da entidade, que já era de massa no chão da fábrica, agora encontrou o patamar da real possibilidade de fazê-lo e essa é mais uma enorme lição e conquista desse movimento. Nós vemos, inclusive, que há, sim, a hipótese dos trabalhadores e trabalhadoras de Volta Redonda retomarem em suas mãos o controle da entidade e reconduzir essa ferramenta ao caminho da independência de classe e, por esse objetivo, nós seguiremos cerrando fileiras no apoio a esse processo para que se arranque conquistas da pauta e, ato contínuo, possa-se derrotar os pelegos e agentes patronais da casa do trabalhador que é o sindicato. 

Nessa empreitada será preciso unidade, coesão e formação política para essa vanguarda. É necessário princípio ideológico para que a moral da luta operária prevaleça diante das pressões, perseguições e tentativas de cooptação desses lutadores ao terreno do inimigo que é a patronal e seus agentes.

Quero, por fim, tomar dois temas. O primeiro é que tenho sido testemunha que desde a Comissão de Base tem se gestado e se consolidado o princípio da democracia operária para a tomada de todas as decisões. Isso tem um valor inestimável, pois trata-se, aqui, do exercício de outro grande princípio forjado na história da luta de classes. Os trabalhadores e trabalhadoras da CSN devem ter orgulho desse fato, estimular, preservar e ampliar esse mecanismo; afinal, nenhum membro da comissão é maior que ela própria e nenhuma futura direção sindical deverá ser maior que as assembleias gerais de uma categoria. E assim se faz mudança, resgatam-se métodos e princípios da classe operária. São as lições da luta que transitam de seus aspectos que vão da luta econômica a elementos estratégicos.

O segundo não menos importante devido a sua dimensão. Nessa luta foram muitos os momentos que nos vimos conversando e redescobrindo o quão é necessário, para além da luta contra a CSN, lutarmos para destruir esse sistema capitalista e nessa guerra formarmos um novo tipo de sociedade, uma sociedade socialista, sem cúpula ditadora, onde a democracia o governe, onde os meios de produção sejam estatais e coletivos e tudo que produzirmos seja para atender as necessidades de nossa classe e, para isso, o sejam socialmente divididos.

Falo que é um anúncio do tema, como disse, pela sua dimensão e profundidade o que, certamente, nos levará a inúmeras outras conversas até, quem sabe, nós podemos nos encontrar todos alinhados em defesa dessa estratégia.

Quem diria? Como vocês mesmo falam: "A gente começou só pela pauta, pelos 30%, mas agora não, nós estamos vendo tudo e já percebemos que é mais do que isso. É contra o sistema”. É isso meus camaradas, bem vindo às fileiras da luta de classes. E tem de ser "contra o sistema capitalista, sim".

#tamojunto!

Por Atnágoras Lopes

 

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